Na noite do último sábado, o tradicional programa Altas Horas, comandado por Serginho Groisman, tornou-se o epicentro de uma discussão nacional que extrapolou o entretenimento e revelou feridas sociais que persistem no Brasil contemporâneo.
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O momento, que começou como uma participação musical e festiva, acabou se transformando em um desabafo sincero de Leilah Moreno — cantora, atriz e uma das vozes mais potentes do cenário artístico brasileiro — sobre racismo estrutural, falta de reconhecimento e o desgaste emocional acumulado por anos de enfrentamento silencioso.
O relato de Leilah comoveu, desconcertou e, ao mesmo tempo, dividiu opiniões nas redes sociais, provocando uma onda de solidariedade e também reações defensivas. O episódio gerou debates que seguem repercutindo e forçou todos os envolvidos, inclusive o apresentador Serginho Groisman, a se posicionar publicamente.
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O momento que paralisou o estúdio
Leilah Moreno foi convidada para cantar sucessos que marcaram sua carreira e falar sobre seus projetos atuais. Durante a entrevista, Serginho perguntou sobre sua trajetória, e ela começou a relatar os altos e baixos que experimentou ao longo de mais de duas décadas de carreira.
Em tom inicialmente tranquilo, a cantora destacou as conquistas que a tornaram referência no R&B e na música popular brasileira. Porém, ao mencionar os obstáculos que encontrou pelo caminho, sua voz embargou:
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“Eu trabalho desde muito nova. Já cantei nos lugares mais improváveis, enfrentei portas fechadas, comentários preconceituosos, olhares de desprezo… E mesmo depois de tantos anos, ainda me perguntam se eu sou ‘capaz’ ou se eu ‘mereci’ estar aqui.”
O silêncio no estúdio foi imediato. Alguns aplausos tímidos surgiram, mas Leilah prosseguiu:
“Ser uma mulher negra nesse país é carregar um fardo que ninguém vê. A gente tem que ser forte o tempo todo, mas isso cansa. E chega uma hora em que a gente quer apenas existir, sem precisar provar nada.”
Serginho, tentando retomar o clima, fez uma intervenção que muitos consideraram inadequada:
“Mas você é muito querida, Leilah. Todo mundo te reconhece pelo seu talento. Não podemos deixar essas coisas te derrubarem.”
Embora a frase parecesse ter a intenção de consolar, foi interpretada por parte do público como um gesto de minimizar a dor expressada pela artista. Alguns na plateia reagiram com expressões de incômodo. Outros aplaudiram em solidariedade.
As primeiras reações
Em poucos minutos, o trecho foi parar no Twitter, acompanhado de comentários que variavam entre elogios à coragem de Leilah e críticas à forma como Serginho tentou “encerrar o assunto” sem aprofundar o debate.
A #LeilahMoreno rapidamente alcançou os assuntos mais comentados, junto com a #AltasHoras e o nome do apresentador. Enquanto muitos consideravam que a fala de Serginho refletia o desconforto social com temas delicados como racismo e esgotamento emocional, outros o defenderam, destacando seu histórico de acolhimento e debates sobre questões sociais.
O pronunciamento de Leilah Moreno
Na manhã de domingo, Leilah fez uma postagem longa em seu Instagram, com tom respeitoso, mas firme. Ela explicou que seu desabafo foi um reflexo de anos de sentimentos reprimidos:
“Eu não queria transformar o Altas Horas em um tribunal, mas chegou um momento em que eu não consegui mais conter a dor. O palco é também um lugar de verdade, e eu precisava falar. Sei que o Serginho não teve má intenção. Ele sempre me tratou bem. Mas às vezes o que a gente espera não é um consolo apressado, é apenas que escutem.”
Na mesma postagem, ela agradeceu as mensagens de apoio e reforçou a importância de artistas negros ocuparem espaços de destaque sem serem constantemente questionados sobre sua legitimidade.
Serginho Groisman quebra o silêncio
Na noite de domingo, Serginho publicou um vídeo de quase 10 minutos em suas redes sociais. Visivelmente abatido, ele reconheceu que o momento exigia mais escuta e menos pressa de “resolver” o assunto:
“Eu assisti novamente à gravação e compreendo que minha reação pode ter parecido uma forma de encerrar o tema rápido demais. Eu jamais quis minimizar o sentimento da Leilah. Pelo contrário, tenho imenso respeito por ela e pela luta que representa.”
Ele destacou ainda que se compromete a seguir promovendo conversas sobre questões raciais e emocionais no programa:
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“O Altas Horas sempre foi e continuará sendo um espaço aberto. E se eu puder aprender mais sobre como conduzir esses momentos, é isso que vou fazer.”
Uma onda de solidariedade e reflexão
Artistas como Taís Araújo, Lázaro Ramos, Elza Soares (em perfil administrado por sua família) e Emicida manifestaram solidariedade. Emicida escreveu:
“Respeito máximo à Leilah por colocar o coração na mesa. Respeito ao Serginho por reconhecer que nem sempre a gente sabe como agir. Esse é o caminho: diálogo, humildade e disposição para evoluir.”
Especialistas em psicologia e sociologia também aproveitaram a repercussão para ressaltar que a saúde mental de artistas negros costuma ser negligenciada, pois se espera deles uma resiliência infinita — uma cobrança que destrói.
O debate sobre representatividade e escuta ativa
O episódio expôs algo maior que um possível mal-entendido: a dificuldade da sociedade brasileira de lidar com a vulnerabilidade alheia. Para muitos, quando pessoas negras expressam sofrimento, há uma tendência a responder com frases como “não pense nisso” ou “não deixe te atingir”, em vez de simplesmente acolher.
A pesquisadora e professora de sociologia Elisa Azevedo comentou em um artigo que viralizou:
“A fala de Leilah é o grito de uma geração que se vê obrigada a parecer forte o tempo todo. E a reação desconfortável mostra que ainda não sabemos escutar sem nos sentirmos atacados.”
Próximos passos
Segundo a produção do Altas Horas, há planos para convidar Leilah Moreno novamente, dessa vez em um formato que permita um diálogo mais amplo sobre preconceito, saúde mental e desigualdade. A ideia seria trazer também outros artistas para compartilhar vivências e propor caminhos de transformação.
Leilah, por sua vez, afirmou que seguirá fazendo da sua arte e da sua história instrumentos de conscientização. Em suas palavras:
“Se minha dor pode inspirar outras pessoas a falar, então tudo isso terá valido a pena.”
Uma lição para todos
O episódio no Altas Horas não foi apenas um momento de televisão. Foi um espelho que refletiu as feridas abertas do Brasil — e também uma oportunidade para que se aprenda que empatia não é calar a dor do outro com frases de efeito, mas simplesmente sentar ao lado, escutar e reconhecer.
Enquanto isso, fãs e colegas seguem enviando mensagens de carinho, desejando que Leilah encontre força e serenidade para continuar sua jornada — e que o país aprenda a escutar melhor aqueles que por muito tempo não foram ouvidos.